Por: Nelson de Paula.
Francisco da Costa Gomes - 04/06/2017
No dia 22 de agosto de 1975, Costa Gomes encontrou-se durante 45 minutos com o embaixador norte-americano. Frank Carlucci começou por salientar que Portugal atravessava agora um "momento crucial" e que as decisões fundamentais estavam nas mãos de Costa Gomes. De acordo com os seus discursos, os Estados Unidos entendiam que o Presidente favorecia um regime de "socialismo democrático".
Aguardavam, no entanto, indicações concretas de que este era o caminho que o país iria trilhar. Portugal estava, insistiu o embaixador, num "momento de viragem" e era necessário que o Presidente tomasse determinadas "decisões políticas", caso pretendesse alcançar os objetivos que, acreditava Carlucci, ambos partilhavam. Costa Gomes pareceu inclinar a cabeça em sinal de "concordância", embora, acrescentou Carlucci no relato enviado para Washington, "com ele nunca se saiba".
A maior surpresa para Carlucci foi quando Costa Gomes lhe afirmou que o Partido Comunista tinha mudado muito e que era indispensável a sua presença continuada no novo Governo em formação. Carlucci argumentou que as mudanças dos comunistas portuguesas eram meramente "táticas" e que Cunhal nunca o poderia convencer a ele nem ao Governo norte-americano de que seria "uma força a favor da liberdade e da democracia em Portugal".
Costa Gomes admitiu que a mudança de Cunhal poderia ser "tática", mas que, no contexto de então, era necessário que o próximo Governo continuasse a incluir membros do PCP. O partido tinha uma vasta base social de apoio na classe operária da cintura industrial de Lisboa e de Setúbal e, por conseguinte, o seu afastamento do Governo seria sinónimo de "violência, greves e outras táticas disruptivas", algo que o novo Governo não conseguiria enfrentar.
No final da reunião, Costa Gomes disse não ter dúvidas que a "influência comunista" estava a diminuir e que a situação iria melhorar. As Forças Armadas tinham dado um "forte sinal" de que não pretendiam um "Portugal comunista". Nos comentários enviados para Washington, Carlucci considerava as palavras de Costa Gomes acerca do PCP extremamente leves, mas reconhecia que ele poderia ter razão quando evocava a capacidade de mobilização dos comunistas em Lisboa e em Setúbal.
Na altura em que Carlucci insistia junto de Costa Gomes para que este tomasse uma decisão relativamente ao futuro político de Portugal, também o Presidente português tinha um pedido para fazer ao Governo dos Estados Unidos. No encontro acima descrito, Costa Gomes apresentou ao embaixador norte-americano um "pedido formal" de auxílio para o transporte dos cerca de 300 mil portugueses que pretendiam regressar de Angola.
Portugal conseguiria apenas transportar um terço destes "refugiados", utilizando 3 aviões da TAP, mas não dispunha de meios suficientes para criar a verdadeira "ponte aérea" necessária para trazer de volta de Angola os restantes 200 mil portugueses. Costa Gomes pretendia saber se os Estados Unidos estavam dispostos a ajudar Portugal nesta missão.
O embaixador Frank Carlucci decidiu então estabelecer uma ligação muito direta entre o pedido que acabava de receber por parte do Presidente da República e as mudanças políticas que, na opinião dos Estados Unidos, deveriam verificar-se em Portugal.